sábado, 21 de dezembro de 2013

Um ano chamado Basquiat





Profa. Dra. Lilian Cristina Monteiro França
Pós-Doutora em História da Arte/UNICAMP
Universidade Federal de Sergipe
Membro da ABCA e da AICA



          Se os anos recebessem nomes, como as ruas, este deveria se chamar Basquiat.
          Em que pese a incrível ascensão da China no mercado internacional de leilões de arte contemporânea, que assumiu entre 2006 e 2008 o terceiro lugar e em 2009 o primeiro em volume de vendas (durante uma crise financeira mundial capitaneada pelo Lehman Brothers); em que pese 209 dos 500 Top Artists ranqueados pela Artprice terem nascido na China; em que pese a queda do volume de vendas em mais de 200 milhões de euros com relação ao ano passado; o sangue latino do americano nascido no Brooklin, Jean-Michel Basquiat, recuperou o posto de primeiro colocado para os Estados Unidos e deixou marcadas 34 das 72 páginas do anuário Contemporary Art Market-2013.
          Não o poderia ter previsto René Ricard quando em 1981 publicava nas páginas da ARTFORUM o memórável "The Radiant Child" e perguntava "How did he come up with the words he puts all over everything?" Mas Ricard escreveu, visionariamente talvez, que as obras que via lembravam um certo tipo de "Chinese literati-type"...
          "New Art New Money", o título da matéria escrita por Cathleen Mcguigan  em 1985 para a matéria de capa da revista do The New York Times fazia menção a reestruturação de um mercado de arte que, segundo a autora, passava de "frio e cerebral" para "volátil e passional". Naquele momento as obras de Basquiat eram vendidas por 10, 25 ou 50 mil dólares e já representavam valores muito altos para uma geração de artistas emergentes.
           Os novos contornos conferidos por Basquiat à técnica do grafite  deixaram as paredes do So-Ho novaiorquino para estampar os principais catálogos de leilões de arte contemporânea duas décadas mais tarde. No primeiro semestre de 2013 foram leiloados pela Christie´s  82 lotes com obras de Basquiat, todos vendidos, arrecadando mais de 162 milhões de euros, quase um terço do volume total de vendas dos leilões realizados nos Estados Unidos. "Dustheads" (1982) foi arrematada por 48.8 milhões de dólares.
          Em outros leilões os resultados foram igualmente impressionantes: "Untitled - Yellow Tar and Feathers" (1982) foi vendido por 25.9 milhões de dólares para Lary Gagosian (Sotheby´s, novembro de 2013).
          Os resultados surpreenderiam o artista, talvez não, talvez ele dissesse "It’s about 80% anger". Mas raiva não é, decididamente, uma palavra que combine com a performance de Basquiat em 2013.
          Sociólogos da Arte, como Raymonde Moulin e Alain Quemin, sinalizam para a ascensão da arte contemporânea, provocada pela estabilização dos mercados de "clássicos" e "modernos", alavancada pela especulação financeira e cada vez mais controlada por uma rede internacional de marchands, galerias, instituições que atuam sobretudo em feiras e leilões, mas também em bienais, exposições e eventos artísticos, lançando mão de um forte aparato midiático para promover artistas e grupos.
          É interessante perceber que o movimento em torno do nome de Basquiat intensificou-se a partir de 2012. Em junho do ano passado a Gagosian londrina abriu a exposição "Jean-Michel Basquiat and Andy Warhol - Olympic Rings" para coincidir com os Summer Olympic Games que aconteciam em Londres.
Em fevereiro de 2013 a Galeria Gagosian de em Nova Iorque abriu a exposição "Jean-Michel Basquiat", reunindo 50 de suas obras, foi considerada a maior exposição do artista, recebeu cerca de três mil visitantes por dia e estruturou-se nos moldes de uma "exposição blockbuster".
          Em maio de 2013 a Gagosian levou a exposição para Hong Kong. Foi a  primeira exposição de Basquiat em Hong Kong, atraindo a atenção do forte mercado asiático de arte contemporânea.
          No mesmo período (maio de 2013) a Sotheby´s  abriu "Man Made -Jean-Michel Basquiat", apresentando cerca de trinta obras que seriam leiloadas ao longo do ano.
          Estava criado o ambiente midiático para a realização dos grandes leilões de obras de Basquiat. O  realizado pela Christie´s  ("The 11th Hour Auction") no dia 13 de maio de 2013  foi inesquecível, elevando os preços de "um basquiat" para patamares surpreendentes; o da Sotheby´s, em novembro, não ficou atrás.
          A vasta produção de Basquiat ajuda a aquecer esse mercado, afinal, em 27 anos de vida (8 de carreira) ele produziu: mais de mil pinturas e mil desenhos (dados do site da Christie´s). O mercado de arte está agitado e não é difícl que novos recordes venham a ser quebrados pelo artista, afinal, como ele mesmo disse: “I thought I was going to be a bum the rest of my life”.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

A ÉTICA E A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HOJE

A ÉTICA E A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HOJE
Mario Sergio Cortella
Professor-Titular do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da PUC-SP

Ressaltemos desde o início: a ética é uma questão absolutamente humana! Só se pode falar em ética quando se fala em humano, porque a ética tem um pressuposto: a possibilidade de escolha. A ética pressupõe a possibilidade de decisão, ética pressupõe a possibilidade de opção.
É impossível falar em ética sem falar em liberdade. Quem não é livre não pode, evidentemente, ser julgado do ponto de vista da ética. Outros animais, ao menos nos parâmetros que utilizamos, agem de forma instintiva, não deliberada, sem uma consciência intencional. Cuidado. Há quem diga: “Eu queria ser livre como um pássaro”; lamento profundamente, pois pássaros não são livres, pássaros não podem não voar, pássaros não podem escolher para onde voam, pássaros são pássaros. Se você quiser ser livre, você tem de ser livre como um humano. Pensemos em algo que pode parecer extremamente horroroso: como disse Jean-Paul Sartre, nós somos condenados a ser livres.
Da liberdade, vêm as três grandes questões éticas que orientam (mas também atormentam, instigam, provocam e desafi am) as nossa escolhas: Quero? Devo? Posso? Retomemos o cerne: o exercício da ética pressupõe a noção de liberdade. Existe alguém sobre quem eu possa dizer que não tem ética? É possível falar que tal pessoa “não tem ética”? Não, é impossível. Você pode dizer que ele não tem uma ética como a tua, você pode dizer que ele tem uma ética com a qual você não concorda, mas é impossível dizer que alguém não tem ética, porque ética é exatamente o modo como ele compreende aquelas três grandes questões da vida: devo, posso, quero?
Tem coisa que eu devo mas não quero, tem coisa que eu quero mas não posso, tem coisa que eu posso mas não devo. Nessas questões, vivem os chamados dilemas éticos; todas e todos, sem exceção, temos dilemas éticos, sempre, o tempo todo: devo, posso, quero? Tem a ver com fi delidade na sua relação de casamento, tem a ver com a sua postura como motorista no trânsito; quando você pensa duas vezes se atravessa um sinal vermelho ou não, se você ocupa uma vaga quando vê à distância que alguém está dando sinal de que ele vai querer entrar; quando você vai fazer a sua declaração de Imposto de Renda; quando você vai corrigir provas de um aluno ou de um orientando seu; quando você vai cochilar depois do almoço, imaginando que tem uma pia de louça que talvez seja lavada por outra pessoa, e como você sabe que ela lava mesmo, e que se você não fi zer o outro faz, você tem a grande questão ética que é: devo, posso, quero? Por exemplo, quando se fala em bioética: podemos lidar com clonagem? Podemos, sim. Devemos? Não sei. Queremos? Sim. Clonagem terapêutica, reprodutiva? É uma escolha. Posso eu fazer um transplante intervivos? Posso. Devo, quero? Tem coisa que eu devo, mas não quero; aliás, a área de Saúde, de Ciência e Medicina, é recheada desses dilemas éticos. Tem muita coisa que você quer, mas não pode, muita coisa que você deve, mas não quer.
Na pesquisa, já imaginou? Por que montamos comitês de pesquisa, por que a gente faz um curso sobre ética na pesquisa? Porque isso é complicado, e se fosse uma coisa simples, a gente não precisava fazer curso, não precisava estudar, não precisava se juntar. É complicadíssimo, porque estamos mexendo com coisas que têm a ver com a nossa capacidade de existir. Quando se pensa especialmente no campo da ética, a relação com a liberdade traz sempre o tema da decisão, da escolha. Por que estou dizendo isso? Porque não dá para admitir uma mera repetição do que disseram muitos dos generais responsáveis pelo holocausto e demais atrocidades emanadas do nazismo dos anos de 1940. Exceto um que assumiu a responsabilidade, todos usaram o mesmo argumento em relação à razão de terem feito o que fi zeram. Qual foi? “Eu estava apenas cumprindo ordens”. “Estava apenas cumprindo ordens”, isso me exime da responsabilidade? Estava apenas obedecendo... Essa é uma questão séria, sabe por quê? Porque “estava apenas cumprindo ordens” implica a necessidade de pensarmos se a liberdade tem lugar ou não.
Ética tem a ver com liberdade, conhecimento tem a ver com liberdade, porque conhecimento tem a ver com ética. Por isso, se há algo que também é fundamental quando se fala em ciência, ética na pesquisa e produção do conhecimento, é a noção de integridade. A integridade é o cuidado para se manter inteiro, completo, transparente, verdadeiro, sem máscaras cínicas ou fi ssuras. Nessa hora, um perigo se avizinha: assumir- se individual ou coletivamente uma certa “esquizofrenia ética”. Ela desponta quando as pessoas se colocam não como inteiras, mas repartidas em funções que pareceriam externas a elas. Exemplos? “Eu por mim não faria isso, mas, como eu sou o responsável, tenho de fazê-lo”. Ora, eu não sou eu e uma função, eu sou uma inteireza, eu não sou eu e um professor, eu e um pesquisador, eu e um diretor, eu e um Secretário, eu sou um inteiro. “Eu por mim não faria”, então eu não faço!
Cautela! Coloca-se um estilhaçamento da integridade: “Eu, por mim, não lhe reprovaria, mas como eu sou seu professor, eu tenho que reprovar”; “Eu, por mim, não lhe mandaria embora, mas como eu sou seu chefe...”; “Eu, por mim, não lhe suspenderia, mas como eu sou seu superior...”; “Eu, por mim, não faria isso, mas como eu sou o contador...”; “Eu, por mim, não faria isso, mas como eu sou o responsável pelo laboratório...”.: “Eu por mim não faria”, então eu não faço; “Eu por mim não lhe reprovaria”, então não reprovo. De novo: eu não sou eu e uma função, eu não sou eu e um pesquisador, eu e um chefe do laboratório, eu e um diretor de instituto, eu e um Secretário... O esboroamento da integridade pessoal e coletiva é a incapacidade de garantir que a “casa” fi que inteira, e para compreender melhor a idéia de “casa íntegra”, vale fazer um breve passeio pelas palavras. Talvez as pessoas que estudaram um pouco de etimologia se lembrem que a palavra ética vem pra nós do grego ethos, mas ethos, em grego, até o século VI a. C., signifi cava morada do humano, no sentido de caráter ou modo de vida habitual, ou seja, o nosso lugar. Ethos é aquilo que nos abriga, aquilo que nos dá identidade, aquilo que nos torna o que somos, porque a sua casa é o modo como você é, onde está a sua marca. Mais tarde, esse termo para designar também o espaço físico foi substituído por oikos. Aliás, o conhecimento mais valorizado na sociedade grega era o que cuidava das regras da casa, para a gente poder viver bem e para deixar a casa em ordem. Como o vocábulo nomos signifi ca “regra” ou “norma”, passou-se a ter a oikos nomos (a economia) como a principal ciência. No entanto, a noção original de ethos não se perdeu, pois os latinos a traduziram pela expressão more, ou mor, que acabou gerando pra nós também uma dupla concepção; uma delas é “morada”, e a outra, que vai ser usada em latim, é o lugar onde você morava, o seu habitus. Olha só, a expressão “o hábito faz o monge” não tem a ver com a roupa dele, habitus; habitus é exatamente onde nós vivemos, o nosso lugar, a nossa habitação.
Quando se pensa em ética e produção do conhecimento hoje, a grande questão é: como está a nossa possibilidade de sustentar a nossa integridade; essa integridade, como se coloca? A integridade da vida individual e coletiva, a integridade daquilo que é mais importante, porque uma casa, ethos, tal como colocamos, é aquela que precisa fi car inteira, é aquela que precisa ser preservada. Como está a morada do humano? Essa morada do humano desabriga alguém? Alguém está fora da casa, alguém está sem comer dentro dessa casa? Alguém está sem proteção à sua saúde, alguém está sem lazer dentro dessa casa? Essa morada do humano é inclusiva ou é exclusiva? Essa morada do humano lida com a noção de qualidade em ciência, ou lida com a noção de privilégio? Cuidado. Duas coisas que se confundem muito em ciência são qualidade e privilégio; qualidade tem a ver com quantidade total, qualidade é uma noção social, qualidade social só é representada por quantidade total. Qualidade sem quantidade não é qualidade, é privilégio. São Paulo é uma cidade em que se come muito bem, é verdade; quem come, quem come o quê? Qualidade sem quantidade total não é qualidade, é privilégio. Todas as vezes em que se discute essa temática, aparece a noção de uma qualidade restrita, e qualidade restrita, reforcemos, é privilégio. Nesse sentido, a grande questão volta: será que, na morada do humano, alguém está desabrigado? Será que essa casa está inteira, ela está em ordem nessa condição? Nessa nossa casa, quando a gente fala em cuidado, é o mesmo que falar em saúde; aliás, quando digo: “eu te saúdo”, ou, “queria fazer aqui uma saudação”, etimologicamente é a mesma coisa. Saudar é procurar espalhar a possibilidade de cuidado, de atenção, de proteção. Nossa casa, que casa é essa? Há nela saúde? A ética é a morada do humano; como essa casa é protegida? Qual é o lugar da ciência dentro dela? Qual é o papel que ela desempenha? Qual é a nossa tarefa nisso, para pensar exatamente aquelas três questões: posso, devo, quero?
É claro que essas questões e suas respostas não são absolutas, elas não são fechadas, elas são históricas, sociais e culturais. A mesma pergunta não seria feita do mesmo modo há vinte anos; a grande questão no nosso país há cento e cinqüenta anos, a grande questão ética há cento e cinqüenta anos era se eu podia açoitar um escravo e depois cuidar dele, ou só açoitá-lo e deixá-lo pra ser cuidado pelos outros; se eu poderia extrair o dente de alguém, se é mais recomendável para o dentista que ele faça a extração ou que ele tente o tratamento. Há alguns anos, algumas décadas, uma discussão de natureza ética era algo que nem passaria pela cabeça de um dentista. A pessoa chegava ao seu consultório e dizia: “Eu quero que o senhor arranque todos os meus dentes”. Ele respondia: “Tá bom”; hoje, você tem outra questão. O mesmo vale em relação ao uso de contraceptivos ou à legalização do aborto consentido, ou ainda sobre a separação entre princípios religiosos e conduta científi ca. Quando se pensa na manutenção da integridade, do devo, posso e quero, a grande questão, junto com essa tríade, é se estamos dirigindo, como critério último, a proteção da morada do humano, da morada coletiva do humano. Afi nal de contas, não somos humanos e humanas individualmente, pois só o somos coletivamente. Fala-se muito em vivência, quando referimos a vida humana; no entanto, o mais correto seria sempre dizer convivência, pois ser humano é ser junto. Desse modo, a noção de ethos, a noção de morada do humano, oferece um critério para responder ao posso, devo e quero, que é: protejo eu a morada ou desprotejo? Incluo ou excluo? Vitimo ou cuido?
Em um livro delicioso e de complexa leitura, Ética da Libertação, Enrique Dussel escreve sobre um percurso da história da ética dentro do mundo. Começa exatamente mostrando o lugar que a refl exão ética ocupa na história humana, mas conclui com algo que alguns até achariam curioso, hoje: ele não aceita a noção do termo exclusão, ou falar em excluídos, porque acha que a noção de excluído é muito pequena e insufi ciente. Dussel, ao pensar a Ética e os processos sociais, econômicos e culturais, trabalha com a noção de vítimas: as vítimas do sistema, as vítimas da estrutura. Pensa ele que, quando se fala em excluído, dá-se a impressão de que é uma coisa um pouco marginal, lateral, enquanto vitimação é uma idéia mais robusta e incisiva. A principal virtude ética nos nossos tempos, para poder manter a integridade e cuidar da casa, da morada do humano, é a incapacidade de desistir, é evitar o apodrecimento da esperança, é evitar aquilo que padre Antonio Vieira apontou, no começou de um de seus Sermões, da seguinte maneira: “O peixe apodrece pela cabeça”. Já viu um peixe apodrecer? Tal como algumas pessoas, ele apodrece da cabeça para o resto do corpo... Um olhar sobre a ética em ciência e na pesquisa tem uma fi nalidade: manter a nossa vitalidade, manter a nossa vitalidade ética, mostrar que nós estamos preocupadas e preocupados, que a gente não se conforma com a objetividade tacanha das coisas, que a gente não acha que as coisas são como são e não podem ser de outro modo, que a gente não se rende ao que parece ser imbatível.
Ser humano é ser capaz de dizer não, ser humano é ser capaz de recusar o que parece não ter alternativa, ser humano é ser capaz de afastar o que parece sem saída. Ser humano é ser capaz de dizer não, e só quem é capaz de dizer não pode dizer sim; aí está a nossa liberdade. Tem gente que diz assim: “Ah, a minha liberdade acaba quando começa a do outro”; cuidado, a minha liberdade acaba quando acaba a do outro. Liberdade, como saúde, tem de ser um conceito coletivo, a minha liberdade não acaba quando começa a do outro, a minha liberdade acaba quando acaba a do outro. Se algum humano não for livre, ninguém é livre, se algum homem ou mulher não for livre da falta de trabalho, ninguém é livre; se algum homem ou mulher não for livre da falta de socorro, de saúde, ninguém é livre; se alguma criança não for livre da falta de escola, ninguém é livre; a minha liberdade não acaba quando começa a do outro, minha liberdade acaba quando acaba a do outro. Ser humano é ser junto, e é em relação a isso que vale pensarmos nossa capacidade de dizer não a tudo que vitima e sermos capazes de proteger o que eleva a Vida. O vínculo da Ética com a Produção do Conhecimento está relacionado à capacidade deste de cuidar daquela, isto é, manter a integridade digna da vida coletiva. Ética é a possibilidade de recusar a falência da liberdade, a ética é a nossa capacidade de recusar a idéia de que alguns cabem na nossa casa, outros não cabem; alguns comem, outros não comem; alguns têm graça, outros têm desgraça.
A ética é o exercício do nosso modo de perceber como é que nós existimos coletivamente, e então pensar com seriedade naquilo que François Rabelais vaticinou: “Conheço muitos que não puderam, quando deviam, porque não quiseram, quando podiam”.
Quero? Devo? Posso?

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Segurança na internet: filtros e personalização





Lilian França
publicação original - qua, 30/05/2012 - 19:08
 - http://www.ufs.br/conteudo/seguran-internet-filtros-personaliza-6799.html
Página da UFS

As inúmeras possibilidades de uso da Internet têm também aberto espaço para brechas de segurança que expõem os usuários mais do que se espera. Em desktops, notebooks, tablets, i-phones e androids, uma quantidade preciosa de dados vai se acumulando e integrando bancos de dados que ainda aguardam um mecanismo de filtragem mais potente, mas, mesmo assim, já são capazes de montar pequenos dossiês de cada usuário.
O uso das redes sociais amplia ainda mais essa possibilidade de criação de bancos de dados, relacionando contatos, preferências, rotinas e mesmo características pessoais que demonstram vulnerabilidades e pré-disposições.
Recentemente, a abertura de capital do Facebook na Bolsa de Valores americana, mais precisamente na Nasdaq, criou centenas de milionários e virou notícia em praticamente todos os espaços, da imprensa tradicional à alternativa, do impresso ao digital. O Facebook representa muito mais um investimento de futuro do que de presente, a despeito dos bilhões de dólares negociados. A quantidade de informações reunidas à espera de um garimpo mais fino permitirá a personalização de conteúdos em níveis nunca experimentados.
Nicolas Negroponte, em seu célebre “A vida digital”, anunciava, na década de 90 do século XX, que os nossos refrigeradores seriam capazes de pedir leite ao supermercado, que se comunicaria com o banco e nos restaria recolher as caixas deixadas na porta de casa.
Analistas hoje vão ainda mais longe, afirmando que, em breve, sonharemos com um produto e, ao acordarmos, ele estará cotado na nossa página, com todas as possibilidades de compra, financiamento e entrega. Nada sobrenatural, apenas através da aplicação da lógica matemática e da estruturação de algoritmos que analisam milhares de possibilidades até chegar a mais viável. Princípio semelhante permitiu que em 1996 o supercomputador da IBM – Deep Blue – vencesse o maior enxadrista de todos os tempos, Gary Kasparov. Ao processar mais de 200 milhões de informações por segundo o Deep Blue pôde ter uma visão ampla e até prever, de certo modo, as próximas jogadas do adversário.
Praticamente, ninguém estranha abrir o Google e encontrar lá o local em que se está, Aracaju, São Paulo ou Nova York. Um “simples” sistema de satélite indica a posição correta em que estamos com nossos dispositivos móveis de comunicação. Os celulares, em especial os chamados smartphones (lembrando que smart vem de esperto, inteligente, mas também de violento), traçam nossas rotas pelas ruas pondo fim ao espírito do flanner baudeleriano que se perdia na cidade descobrindo seus cantos e encantos. Hoje, basta perguntar (entenda-se falar a pergunta) ao i-phone “onde está o restaurante chinês novaiorquino mais próximo?” e ele indica um ranking dos dez melhores, segundo o guia Zagat, destes os mais próximos, o preço, os cartões de crédito que aceita e, em alguns casos, o cardápio do dia; indica, ainda, onde estacionar, como chegar a pé, de carro, de ônibus e de metrô e em quanto tempo.
Uma rápida pesquisa acerca de um eletro-eletrônico, via Google, é suficiente para que nossos e-mails se encham de ofertas similares. Entrar no booking.com (tradicional site de reservas de hotéis) é outra atividade intrigante. O “booking” nos segue por várias páginas; entramos no site de um jornal e o banner mostra o último hotel pesquisado; entramos num portal de games e eis o “booking novamente!”, o que lhe confere certo grau de ubiquidade.
Os sistemas inteligentes, assim como a inteligência humana, funcionam tanto para o bem quanto para o mal; e não pretendo tratar aqui dos crimes cibernéticos, ataques de hackers ou ações deliberadamente realizadas para lesar o ser humano, empresas ou países. Refiro-me à sutil coleta de dados e informações que tendem antes a estreitar nosso acesso à informação do que a ampliá-lo.
O livro “O filtro invisível – o que a Internet está escondendo de você?”, de Eli Pariser, mostra uma Internet “feita sob medida”, que através da aplicação de sucessivos filtros, personaliza omitindo, ou seja, não mostra o que acha que não se quer ver. Os exemplos de Pariser mostram um Google que varia de acordo com a postura política do usuário, um Facebook que não atualiza os contatos com os quais se interage pouco, uma Amazon que mostra de imediato livros correlatos aos que já adquirimos e assim por diante. O aplicativo Whatsapp permite saber exatamente a que horas a mensagem foi lida, estabelecendo mais uma forma de controle e vigilância.
Esse grau de desconhecimento acerca do modo como a Internet nos conduz acaba por gerar certo grau de insegurança, uma vez que não sabemos de fato como nossos dados são utilizados.
Em janeiro de 2012, mais de 23.000 alunos tiveram seus dados pessoais vazados através de um e-mail equivocado, passado pela UNISINOS; em maio de 2011, a SONY, através da PlayStation Network, reconheceu o vazamento de dados de 77 milhões de usuários; também em maio do mesmo ano, a Facebook admitiu o vazamento dos dados de seus usuários; em junho de 2012, o banco Santander deixou a mostra no site os dados de 127 pessoas no Brasil; em março de 2012, a operadora Verizon, informou o vazamento de dados de 174 milhões de pessoas. Relatos acompanhados de pedidos de desculpas não diminuem o constrangimento dos que tiveram suas vidas expostas.
Por outro lado, quando o internauta de livre e espontânea vontade decide colocar em seu perfil informações a seu respeito e as tornam públicas não se pode responsabilizar outras pessoas pelos problemas que forem causados por tal exposição.
De acordo com o site TECNOMUNDO, Max Schrems, estudante austríaco “citando uma lei europeia, solicitou formalmente junto ao Facebookque a rede social lhe encaminhasse um relatório com todos os dados que eles dispusessem sobre o seu perfil. Após esperar por algumas semanas, Schrems teve uma surpresa ao abrir um CD com todos os dados armazenados. No total, havia 1.222 páginas de arquivos em PDF com dados sobre a sua movimentação na rede social. Com 234 amigos, Max teve acesso a todas as datas de login e logout em sua conta, quantidade e conteúdo de mensagens enviadas e recebidas e um relatório com todas as vezes que cutucou ou foi cutucado, foi citado por amigos ou interagiu com qualquer item do Facebook. O arquivo recebido pelo jovem listou ainda dados dos amigos com quem ele interagiu, como localização por GPS no caso de fotos taggeadas ou check-ins. Além disso, mesmo as postagens ou informações que ele havia apagado constavam entre os arquivos” (Disponível em http://www.tecmundo.com.br/facebook/16588-estudante-pede-seus-dados-ao-facebook-e-recebe-1-2-mil-paginas-de-resposta.htm). 
Todas essas informações podem, potencialmente, ser utilizadas para uma série de fins, desde o comércio eletrônico até a personalização de conteúdos disponibilizados para o usuário. Isso significa que uma triagem de dados não solicitada é realizada antes de exibir o conteúdo solicitado. Melhor dizendo, se seu amigo de infância, que está na sua rede, mas com quem você não fala muito, postar uma mensagem anunciando o seu casamento você poderá não saber, pois a sua postagem poderá não ser atualizada em sua página em função das poucas trocas de mensagens. É claro que essas ações não são confirmadas abertamente, mas estudos, como o de Eli Pariser, dão fortes indícios desse tipo de situação.
Da mesma forma, Pariser afirma que o Google não é o mesmo para todas as pessoas; a personalização do conteúdo das respostas leva em conta o histórico de navegação de cada um; assim, de acordo com o autor, um usuário com perfil político de direita não receberia links para páginas de esquerda e vice-versa.
Cada vez mais refinados, os filtros vão apontando os links que mais interessam, especializando as consultas. Quanto mais os sistemas inteligentes conhecem seus usuários mais estreito se torna o horizonte de respostas. Claro que não interessa a ninguém receber 5 milhões de respostas, mas, por ouro lado, a pré-seleção, sem consentimento, manipula o acesso à informação, jogando numa zona de sombra uma série de conhecimentos que poderiam ser extremamente importantes, inclusive por fornecer contrapontos e levar a uma atividade intelectual reflexiva.
Apesar de todas as incertezas, inseguranças, riscos e ameaças, o número de pessoas dispostas a tornar públicos dados pessoais na forma de texto, fotos e vídeos, publicar suas mazelas, relatar suas tristezas e vulnerabilidades, dividir os momentos de alegria e festa, enfim, numa forma de exposição pública jamais experimentada vem aumentando.
Fotos em situações constrangedoras, de momentos de alcoolismo, de desmazelo, de situações vexatórias parecem não causar preocupações para a pessoa retratada quando ela mesma as posta. Quase ninguém imagina que aquela foto possa ser pesquisada por uma empresa por ocasião de uma futura contratação; quase ninguém imagina que mesmo deletada a foto, ela se manterá nos arquivos e nos bancos de dados de seu perfil. Aquilo que começa como brincadeira termina tornando-se um fato grave. Os processos que tratam de questões ligadas a esse universo digital ainda engatinham, mas avançam mundo afora.
Não se sabe ao certo os rumos que irão tomar, mas de qualquer forma é sempre bom estar a par do que fica por trás desses aplicativos, sites, redes sociais com os quais dividimos o nosso cotidiano.

Lilian Cristina Monteiro França é Doutora em Comunicação e Semiótica e Pós-Doutora em História da Arte. Professora do Departamento de Comunicação Social, do Mestrado em Letras e do Mestrado em Comunicação e Sociedade da Universidade Federal de Sergipe.
qua, 30/05/2012 - 19:08

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Impressoras 3D revolucionam o mercado


O recente lançamento de uma série de impressoras 3D vem revolucionando o mercado. Com preços a partir de US $ 1.300 (Modelo da The Cube) é possível "imprimir" objetos tridimensionais, como brindes, copos, peças, feitos em diferentes materiais. Em algumas lojas nos EUA já possível "imprimir" em poucos minutos a réplica de um rosto a partir de uma foto por US $5. Usando materiais como plástico do tipo PLA ou ABS, as impressoras mais acessíveis esculpem objetos de tamanho proporcional a uma bola de basquete. As possibilidades de uso no mundo da moda, arte, brinquedos, brindes, relógios ampliam-se a cada dia, aumentando a possibilidade de personalização dos objetos cotidianos que utilizamos. O que antes parecia ficção científica torna-se realidade e promete revolucionar, mais uma vez, o mundo em que vivemos.

  
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